Há algum tempo venho estudando a obra do psicoterapeuta alemão Bert Hellinger, idealizador das Constelações Familiares. De maneira bastante resumida, esta terapia vê a família como um sistema. A cura de um dos membros é realizada a partir da cura do sistema. E curar, para Hellinger, é reordenar. É colocar cada membro da família no que seria o seu lugar. Por isto, ele também chama a sua terapia de ‘as ordens do amor’. A princípio, a Constelação Familiar parece apenas uma excelente terapia para a família. Mas vai muito além disso. O princípio dela é a ordem, e a ordem é necessária em qualquer sistema. A vida existe na ordem. A vida é ordem. “Cosmos”, palavra de origem grega, significa “ordem”. Na astrologia, a ordem é representada pelo planeta Saturno. Este planeta tem lugar de destaque no signo de Libra, que rege os relacionamentos. Para que os relacionamentos – de todos os tipos – funcionem é preciso ordem. Ou, para utilizar outra palavra relacionada a Saturno, é necessário respeito. O respeito é o reconhecimento da ordem. É tal a necessidade de ordem nos relacionamentos que, na maioria das vezes, eles não terminam pela falta de amor, e sim, pela ausência de respeito.
Bert Hellinger postula que “a ordem precede o amor”. Falando de outro modo, o amor só se perpetua no respeito. Assim, se tenho afeto por você, mas não o respeito, em pouco tempo isto incitará o seu ressentimento, e pode ser que cheguemos ao extremo de trocar o amor pelo ódio.A ordem não precisa ser aplicada apenas aos relacionamentos afetivos. Se sou balconista de uma loja e atendo a um cliente com indiferença, estou ferindo a ordem. O cliente está acima de mim, porque eu existo, naquela loja, por causa do que ele paga pela mercadoria que eu vendo. Parafraseando Hellinger, é fácil concluir que a gentileza será decorrência do respeito que eu tenho pela existência do cliente.
Eu reconheço a importância dele, eu o trato bem, e, quando faço isto, tudo funciona como tem de ser: a venda, a compra, o lucro, todo o processo. O trabalho de Constelações Familiares já vem sendo aplicado no mundo corporativo. Quando, por exemplo, um chefe tem um funcionário que é um crítico ferrenho dele a ordem está corrompida. Todos podemos e devemos dar sugestões, mas o lugar de chefe – queiramos ou não – é ocupado apenas por um. Acima dele pode ter um outro chefe, mas naquela instância ele foi incumbido da liderança. O funcionário que, isoladamente, se torna um detrator do chefe tenta se colocar em um lugar que não lhe pertence. Não funciona. Ou ele vai corromper o sistema plantando a insatisfação ou será eliminado. Esta, aliás, é outra coisa interessante na obra do terapeuta alemão: é possível perceber onde a ausência de ordem poderá causar estragos.
Na realidade, Hellinger diz que o amor é a maior força que existe. Por amor, compensações, ainda que doentias, são geradas. Um membro não reconhecido de um sistema familiar acaba reaparecendo em membros posteriores a ele, que sequer sabem que estão compensando sentimentos daquele que foi excluído. Estes são apenas alguns exemplos. No meu trabalho como astróloga e terapeuta, procuro ficar atenta aos princípios da ordem. Atendo a clientes que se ressentem porque o chefe não entende que eles chegam atrasados, ainda que trabalhem mais voluntariamente depois. Faço com que compreendam que se o chefe se importa com o atraso, eles precisam se adequar ao sistema. Tudo irá funcionar melhor. O chefe terá menos um motivo de desgaste, podendo se dedicar mais ao que lhe compete e as qualidades do empregado, por sua vez, irão ganhar maior destaque do que se o chefe estivesse insatisfeito com seu comportamento. Isto não significa que tenhamos de ser ‘vaquinhas de presépio’. É o contrário: os fortes são os melhores cumpridores da ordem. Se a ordem é inerente, deve ser reconhecida, assim como, por exemplo, se reconhece que o mar com temor e respeito.
Reconhecer a força do mar é ser sábio. Colocar as coisas nos seus devidos lugares, também. O sábio navega no mar. O tolo afunda. Ou se afoga. A ordem também nos liberta de esforços desnecessários. Tomando como exemplo as competições familiares, é um esforço colossal querer ser melhor do que a mãe ou o pai: “meu pai é uma má pessoa e eu sou melhor do que ele”. Se você coloca o seu pai no lugar dele, isto é, acima de você, porque você veio depois, não tem de julgá-lo, e então não tem de ser melhor ou pior do que ele. Menos algo a ser feito. Mais energia para a vida. Ocorre o mesmo com o vendedor que aceita o cliente. O vendedor ressentido com sua posição não vende bem, não produz e não é feliz. É melhor que comece a pensar em fazer outra coisa, ou então em mudar. Acredito , portanto, que antes de ensinarmos qualquer técnica de vendas, algumas vezes temos de ensinar a humildade.
O bom vendedor muitas vezes ganha mais do que o cliente, mas o trata com deferência porque é o cliente que o coloca naquela situação: a de ganhar bem ou de, pelo menos, se sustentar. Tomando outro exemplo de como a ordem simplifica a vida, o homem e a mulher que constroem uma relação em que não haja respeito vão consumir uma quantidade enorme de energia. Que importa que haja afeto se a falta de respeito destrói a dignidade e o equilíbrio que deveria existir entre o casal? Se um está sempre lutando para anular o outro e este para sobreviver? Por isto, mais uma vez, repito Bert Hellinger: a ordem precede o amor. O amor floresce a partir da humildade de reconhecer o lugar de cada um no sistema, honrando-os como devem ser honrados.
Vanessa Tuleski