Como é que vamos libertar a psique dessas cargas? Só através da tomada de consciência podem ser elaboradas as cargas herdadas do passado e, posteriormente liberadas, com a intenção de criar, dar um lugar ao segredo que foi criptografado em um período anterior. Desta forma, incluímos algo novo, mesmo que vazio. Conforme definido pelos antigos chineses, haveria uma ausência, mas a ideia de criar espaço para permitir que a novidade surja. Isso é o vazio: pois não é possível adicionar água a um vaso cheio. Todos nós pertencemos a uma terceira ou quarta geração e, por isso, convidamos você a quebrar o que foi silenciado, combater a invisibilidade e recuperar o não-dito e, finalmente elaborar esse fato para poder avançar. Não olhe para o emaranhamento como uma fatalidade, para o qual foi a pessoa foi condenada à repetição, mas pode ser visto como uma oportunidade de transformação. No entanto, precisamos de um processo de preparação para liberar essas cargas. Como afirma Marcuse em “Eros e Civilização” (1955): “As feridas que se curam com o tempo (e nós adicionamos “sem elaboração”) são também as feridas que contém o veneno. Contra a rendição do tempo, a restauração dos direitos à memória é um veículo de liberação, é uma das mais nobres tarefas do pensamento”.
Nascemos, vivemos e morremos. Basicamente, a vida é isso que acontece entre o nascimento e a morte. Mas será que vivemos mesmo a vida? Nascemos dentro de uma família, de um sistema e contexto. Acredito que escolhemos a família na qual vamos nascer e a que sistema vamos pertencer. Então nascemos e fazemos parte daquele sistema. Quando pensamos em sistema, pensamos em um grupo de coisas, pessoas ou energias que se influenciam mutuamente. Tudo que faz parte de um sistema pertence a ele, influencia todo sistema e é influenciado por todo sistema. Isso inclui o sistema familiar. O sistema familiar é como um rio, que vai levando em sua água tudo que passou por ela, influenciando tudo e todos que se banham nesse rio, cada um que entra nesse rio, tudo que já fez e que ainda faz parte dele. Tudo que entra nesse rio é levado por ele para sempre. Por isso, mesmo que algo ou alguém seja excluído, aquela energia continua sendo levada e influenciando, só que nos casos de exclusão isso se torna mais problemático.
O fato é que somos tão influenciados por esse sistema, que muitas vezes vivemos o sistema e não apenas o nosso “eu”. Em outras palavras, às vezes o sistema vive através de nós e especialmente para lembrar daqueles que foram excluídos ou que viveram qualquer tipo de situação difícil, na tentativa inconsciente de reincluí-los acabamos fazendo escolhas semelhantes às deles e com isso nos desviamos dos nossos propósitos e da nossa essência. Isso acontece também porque a vida acontece em três diferentes níveis: o nível do “eu”, o nível da “alma” ou da “consciência herdada” (que tem a ver com o nosso sistema familiar e todos os nossos ancestrais) e o nível do “espírito” ou da “vida” (onde se incluem a espiritualidade e todas as forças da natureza). Vivemos ao mesmo tempo esses três níveis e podemos escolher de acordo com os três.
Como carregamos nossos ancestrais dentro de nós, pois estamos todos no mesmo rio e porque estão todos em nosso mapa astrológico e em nosso DNA, muitas das nossas escolhas são feitas justamente nesse segundo nível, o nível da consciência herdada. Escolhemos de acordo com aquilo que mais se ajusta ao nosso sistema, seja pela tentativa de fazer parte dele ou pela tentativa de reincluir quem foi excluído. Quando escolhemos tentando reincluir um antepassado (e claro que isso acontece em um nível inconsciente) podemos reviver o que ele viveu, para que ele seja lembrado ou porque por amor estamos carregando por ele. Muitas das nossas escolhas são feitas assim, mesmo sem nos darmos conta disso. Com isso, escolhemos muitas coisas em desacordo com o nosso “eu” e sofremos com as consequências disso. Também escolhemos para pertencer e nesse caso também repetimos as escolhas do sistema. Por exemplo, em um sistema no qual muitas pessoas foram infelizes no amor ou muitas pessoas ficaram gravemente doentes, uma pessoa pode inconscientemente pensar que quando ela é feliz no amor ou é saudável com isso está vivendo um destino diferente e com isso não está pertencendo, como se isso fosse uma traição ao seu sistema de origem.
Claro que tudo isso acontece em um nível muito inconsciente e justamente porque vivemos em uma espécie de transe, que na verdade pertence ao nosso sistema. É assim que a maioria das pessoas vive a vida hoje em dia. Seja pela forte conexão que sempre existe com o sistema seja pela forma como se vive a vida hoje em dia, muita gente vive como que no piloto automático, reagindo à vida ao invés de viver a vida e escolhendo pelo sistema ao invés de escolher por si mesmas. E isso gera boa parte dos nossos problemas. No fundo é como se muitas vezes estivéssemos assistindo a vida ao invés de viver a vida. E a maior parte das pessoas nem se dá conta disso. Viver de verdade é estar presente na própria vida. Estar presente é estar consciente e centrado no “eu” com a consciência do “todo”. É viver integrado nos três níveis, mas consciente do que o “eu” quer e precisa.
É viver consciente de que podemos escolher diferente do nosso sistema e ainda assim pertencer, porque na verdade quando vivemos verdadeiramente a vida é que estamos honrando o nosso sistema. Como carregamos todo nosso sistema dentro de nós, nossos ancestrais continuam vivendo através de nós e quanto mais felicidade, amor, saúde e realização nós tivermos, mais estamos honrando nosso sistema, nossos ancestrais e a vida que recebemos deles. Aliás, honrar quem veio antes é honrar a própria vida, é dizer sim para quem somos e nesse sentido quanto mais aceitarmos nossas origens, melhor, porque assim podemos receber tudo que vem de bom deles. E vale lembrar que só estamos aqui, vivos, porque nascemos deste pai e desta mãe, que por sua vez nasceram dos nossos avós, que nasceram dos nossos bisavôs e assim por diante. Por isso, ao contrário do que inconsciente pensamos e fazemos, é vivendo bem que estamos honrando e fazendo com que o sistema continue vivo. Repetir padrões negativos e histórias difíceis não resolvem os problemas antigos, apenas cria novos problemas.