Quantas vezes já pensamos que a vida que vivemos não é a nossa vida, que nos sentimos em uma prisão, fiéis a um destino que não nos pertence? Muitas vezes somos vítimas involuntárias de sentimentos negativos ou sufocados pela culpa, sem entender o motivo. Imobilizados, condicionados por uma liberdade limitada, incapazes de voar, sem uma razão definida. Mas você não pode ter asas, se você não “sentir” as suas raízes. Uma árvore consegue alcançar o céu somente se possui raízes fortes.
A psicologia, a filosofia oriental e tudo o que estuda e analisa o comportamento e o estado da alma humana, convergem para uma única direção: a consciência. Uma simples palavra que encarna percursos possíveis, o desejo de enfrentar suas limitações e a coragem para ver e observar a si mesmo, construir um diálogo interno, para reconhecer suas próprias origens. De fato, parece que existe uma crença compartilhada de que há uma matriz, um DNA emocional que nos liga aos nossos antepassados. A sociedade contemporânea nos condiciona a uma visão “descartável” da vida e da morte, não reconhecendo o valor daqueles que nos precederam.
O alemão psicoterapeuta Bert Hellinger, analisou com profundo conhecimento de dinâmica de grupo, após anos de estudo e experiência, desenvolveu uma teoria fascinante, compartilhada por médicos e terapeutas de todo o mundo: Constelações Familiares (também chamada de representações sistêmicas). É uma técnica que nos permite identificar tendências que nos são desconhecidas, eventos traumáticos, físicos e mentais, que se repetem de geração em geração e que podem encontrar a causa em conflitos sérios e não resolvidas nas gerações precedentes. Para entender o significado desta técnica é importante ter uma perspectiva sistêmica.
Num sistema, o indivíduo não é importante em si, mas sim como uma função de algo maior. De acordo com Hellinger, cada grupo é um “sistema”, que fornece as chamadas ordens de pertencimento, deixando claro a todos os membros o que é “saudável” ou “correto” e o que não é. O conceito de “ordem” nos obriga a olhar o aspecto “cronológico” (do mais velho) e a um aspecto de disposição, legítima ou correta, dos membros do sistema familiar. Hellinger afirma que todos devem assumir total responsabilidade por aquilo que fazem: as implicações de ações insanas e não são assumidas, cairão sobre todo o sistema.
Sem ter consciência os descendentes estão ligados por uma espécie de vínculo orgânico\emocional a todos os antepassados membros da família, mesmo àqueles que não conheceram, e em virtude de tal vínculo podem, em alguns casos, estar “emaranhados”, ou seja, assumir, por amor, aquele destino. Muitas vezes, um erro cometido, um segredo, exclusão ou o não reconhecimento, sofrido por um membro da família, pode encontrar a sua compensação através de um sucessor, que reintegrará aquele membro no sistema familiar, e para que isso ocorra, o descendente “emaranhado” também pode “reviver” seus sintomas físicos, insucessos nos relacionamentos ou na profissão; perdendo dinheiro ou até mesmo sua vida.
Guerra, crianças não nascidas, suicídios e filhos não reconhecidos, são eventos que causaram muito sofrimento (gerando emaranhamentos), e esse sentimento é transmitido para as crianças, com consequências muitas vezes graves. Uma criança, quando nasce, é totalmente dependente de seus pais e, em especial a sua mãe, a união simbiótica. Para Hellinger, se durante a gravidez, parto ou nos primeiros dois anos de vida, acontecer um evento traumático, uma separação entre mãe e filho, cria o que ele chama de movimento interrompido. Aqueles que sofreram esse choque geralmente desenvolvem um padrão de comportamento que faz com que procurem obter o que tanto desejam, mas ao mesmo tempo, evitarão qualquer possibilidade de sucesso. Essas pessoas desenvolvem um perfeito e sádico mecanismo de autossabotagem impedindo a própria felicidade no amor e/ou prosperidade econômica. Isso explica muitas dinâmicas ligadas a sentimentos impossíveis!
Os pais (“são grandes”) dão aos seus filhos (“são pequenos”) na vida, e isso deveria ser suficiente, para que os filhos os respeitassem. Qualquer julgamento negativo de um filho aos seus pais, de acordo com Hellinger, colocaria o filho numa posição de superioridade, e desta forma, numa posição incorreta no sistema para com aquele que é “grande”. Algumas vezes, os filhos ficam do lado de um dos pais, carregando por amor, o peso da responsabilidade de pais, desempenhando até mesmo o papel de amigos e confidentes: uma desarmonia que leva inevitavelmente ao conflito e a infelicidade. A solução é restituir aos pais as suas responsabilidades ou seus pesos, sem julgamento e sem raiva, agradecendo-os profundamente, só assim você pode ter uma boa qualidade de vida.
Através de uma espécie de representação do “teatro da Constelação”, este processo pode ser trazido à luz e a pessoa se torna consciente do emaranhamento. O nó desata, mudando assim o esquema em que a pessoa foi incorporada, percebendo que seu próprio sacrifício não trará qualquer beneficio. Depois de encenar a sua própria constelação e restabelecer o seu papel no sistema, nos meses seguintes as relações tendem a mudar. O amor infantil, através de representações, se transforma numa forma adulta e mais consciente, que nos torna livres e “não dependentes” e, desta forma, indivíduos adultos, com uma vida mais fácil e serena.
Si trata de dinâmicas difíceis de explicar se contamos somente com a racionalidade do método científico. Alguns comparam o campo de influência da família ao “campo morfogenético”, um termo elaborado pelo biólogo britânico Sheldrake, mas Hellinger prefere se referir à consciência coletiva inconsciente da tradição hinduísta. Certamente, a força deste trabalho reside no efeito que produz em um nível inconsciente, inclusive por meio das frases de cura, que restituem a cada um o seu lugar de direito no sistema familiar. Por esta razão, é importante que o paciente procure e confie um terapeuta/constelador, para o ajude a absorver emocionalmente a nova situação que emergiu. Os velhos padrões, como os velhos hábitos, são difíceis de morrer, mas morrem!
Simona Di Bella